sexta-feira, 30 de março de 2012

Móbile







Aqui dentro.
Dentro do quarto.
Dentro do vazio dos grandes espaços.
Na impossibilidade de suportar o desequilíbrio
o homem inventou o móbile.
Parece que deu certo.
Agora é possível imaginar-nos  seres equilibrados
mesmo quando acima de nós
flutuam   in certezas.

domingo, 25 de março de 2012

Pina


Vestida de alma deixou seu corpo e foi para cama.

Era noite de gala.

Pena















Bailarinas aprisionadas alongavam os corpos 
e recostadas no vidro frio de suas almas seguiam dançando o mundo.



sexta-feira, 23 de março de 2012


Processo criativo da crônica Horário: drive in time
 Processo criativo da crônica- Horário:drive in time
A ideia de escrever uma crônica surgiu de uma possível proposta em aula: escrever um gênero que nunca havia escrito, experimentar. Com isto em mente, comecei a buscar temas do cotidiano. Essa busca também acontecia quando dirigia e, oralmente, simulava pequenos inícios de crônicas sobre o que me atingia, ofendia ou simplesmente tocava. Um dia, em que o tráfego estava intenso, surgiu a frase com que começo a crônica. Dirigir é exercício de meditação.
A afirmação me tocou, dado sua incongruência ou seu potencial de absurdo. Permaneci com ela alguns dias e, então, escrevi alguns parágrafos apenas tentando descrever o que encontrava em meu caminho. Com o exercício da descrição, um percurso surgiu e uma personagem começou a aparecer acompanhada de outras vozes que delineavam diversos caracteres do cotidiano. Creio que, como era um percurso, a personagem deveria chegar a algum lugar e chegou. Não sei precisar porque chegou onde chegou, um local tão absurdo quanto a própria afirmação inicial. Ficou o esboço de um pequeno texto forrado de frases feitas e vozes caóticas. Também um profundo incômodo de um texto ingênuo. Deixei o texto dormir e, quem sabe, dormiria para sempre, não fosse a necessidade de apresentar algo produzido neste tempo de curso.
Em minha mente conspiravam as diversas vozes e a progressão referencial (construção , desconstrução, desfocalização). Retomei o texto observando os elementos que impediam a progressão textual ou, ainda, a progressão da personagem em seu percurso urbano e seu mundo interno. Eliminei o óbvio e redundante de sentido, o que já estava implícito e não precisava ser dito. Ampliei vozes presentes e emudecidas. Assumi o contexto ingenuamente absurdo e fim.  Confesso que o incômodo permanece...

 Horário: drive in time. 

Dirigir é um exercício de meditação. Foi a frase com que comecei o dia quando me dirigia para cá,  e uma bicicleta parecia estar há horas naquela paisagem vítrea e sem velocidade. O guri era magro, forte e usava capacete por cima de um olhar curioso. Assim,  envolvida por essa ideia de meditar, amparei-me nos conceitos do senso comum, deixei-me estar relax no banco do carro, e parei no farol. Uma carroça e um corpo de tronco forte e boca seca pediram passagem. Calma e imergida no exercício de estar presente, meditava. Segui, e por um breve momento, a velocidade existia. Uma moto passou rápida pela direita, eu não a vi e nem me surpreendi.  A lei de trânsito diz que o motorista deve manter o carro a uma distância de 1,5 m de bicicletas, motos, carroças?, e, caso não consiga ultrapassar com esta margem, espere.
Lá estava ele novamente, o capacete curioso. Passei por ela  à 3 metros e não, não foi para garantir que o vento não a tocasse, acho que foi por uma questão de espaço, de propriedade e de ritmo. Novamente adquiria minha velocidade, meu tempo e, claro, meu destino.  Continuei minha reta quando duas mulheres inesperadamente atravessaram à minha frente correndo. A primeira tinha um sorriso travado e um lenço na cabeça, a outra balançava as mãos confusas e medrosas, olhando para canto nenhum. Diminui, o mundo parecia agitado. Entrei à esquerda, e peguei o fim de uma ladeira, quando outra  bike rasgava a via, capacete vermelho sem face. Por certo não daria tempo para ultrapassar e, assim, parei o trânsito para a cena não acontecer.
Virei à esquerda e, finalmente estava na avenida pretendida, mão única e comprida.
Quantas vezes não dirigimos confortavelmente em nossos carros mas, com ritmos atrelados ao movimento da massa na morte da pretendida velocidade. Foi o que ocorreu. - Hoje vim de ônibus! Não, não há sarcasmo, é a realidade que se afigura na cidade acordada. Quando totalmente desperta nos desacorçoa, posso ir a 60 km/h e faço 20km/hora. Normalmente, irrita. Mas hoje não, tentei ligar. Não, não é o momento da meditação. Estava ocupado. Então virei à direita, meu destino tão próximo e  uma pedestre desavisada, apenas olhava também para a direita. Eu, da esquerda, estava invisível, um nada vestido de máquina. Esperei que ela se tocasse e quase que demorou. Desconfiei brevemente da meditação, as ruas tinham realmente apenas mão única, todos agitados, ansiosos, distraídos. Lembrei-me da grande mãe na Índia que distribui abraços e suspirei longamente. Uma fagulha bradou e voltei a dizer, sim, dirigir é um exercício de meditação.  Ter em mente todo ambiente, ter em mente cada ato como parte do espaço das ruas, do todo em que está, cuidar de ritmo e velocidade, e, além disso, claro, ouvir música, notícias, falar no celular, agendar o esquecido, escrever um ou outro verso,  olhar que lá fora, sim, estão todos vivendo, inesperados, desavisados, mas eu cá tenho que manter meu exercício de meditação para não ser tarde demais. Claro, está tarde.
É, talvez eu tenha exagerado, mas não importa, quase pensei que seria o fim do apocalipse, e pararíamos de matar uns aos outros por acidente e distração. Mas, voltando ao que nos interessa, desculpe meu atraso, mas quem não anda atrasado nessa cidade?
- Lamento, mas teremos que marcar um novo horário, senão seu atraso será distribuído aos demais clientes.
- Como?  É claro, estar atrasado não está no predicativo da meditação, mas tão pouco está no predicativo de qualquer um . Sempre espero horas.
- Lamento, é como funcionamos aqui.
- Você me deixa aqui contando algo tão importante para nada!
- Lamento, não trabalhamos com atraso.
- Ou seja, definitivamente, não foi uma boa escolha...
- Lamento, mas nosso clientes costumam dizer que dirigir é um vídeo game.
- Vídeo game? Aquele em que a máquina sempre ganha?
- Lamento, mas nesse caso você deve evitar os obstáculos e cumprir o tempo.
- Que espécie de pessoa, hoje, lamenta alguma coisa?
- É só um jeito...

terça-feira, 20 de março de 2012

A casa do russo (+ o processo de criação deste texto)


A casa do russo   

O russo pensou numa casa
de letras russas, estacas
paredes, pilares,
baldes de frases,
tirados de um livro
de ói ou de évisqui. 

O russo acha que a letra é de barro.

Lápis de lama, chão
Descalços olhos às nuvens.
Não há cimento
Palavras são de encaixe:
Crime, castigo;
Firmeza, ilusão.

De barro e papel,
uma casa de estantes.
Pesados romances e poesia.
Uma casa de instantes,
em longas leituras
sem breve chuva na previsão.

O russo sorri sua casa de barro.

Quando viveu em outra mais firme,
era de cuspe, engasgo,
sapos, sucos gástricos
de merda, tinta branca,
galhos e frases
e pensamentos contrários.

Mas aí choveu.

E era de outra língua a água
E a casa do russo caiu
E feriu-se gravemente
E sangrou dois alfabetos russos
E não morreu por pouco:
Faltaram palavras (em português).

Uma casa caída de barro, do barro se refaz.
E as letras, arquitetura aos cacos?

                                ====== // ======

O processo de criação desse poema

A primeira vez que li a frase,“Bakhtin considera a obra literária como produto da transformação sistemática de um conjunto verbal no todo arquitetônico de um evento esteticamente acabado” senti que acabado estava eu. Felizmente, depois da aula sobre o assunto, entendi bem melhor o que o russo quis dizer. Mas, naquela primeira leitura, havia compreendido tão pouco, que me restou rir, de mim; rir do tombo de bunda, que é a incompreensão. E riu a Ângela também, quando perguntou a mim e a outros colegas se havíamos entendido esse mesmo trecho. Daí que propus à poeta que escrevêssemos algo a partir dessa ideia de Bakhtin. Algo livre, aproveitando o pretexto, um ponto de partida para soltar a pena. Acabei levando a sério, por menos que pareça.
Comecei a escrever no carderno, a lápis, como costumeiramente rabisco lampejos. A primeira frase foi “A casa do russo caiu”. E ficou assim, encabeçando a pequena folha pautada em branco, sozinha, por alguns dias. Até que continuei:

A casa do russo caiu
Feriu-se gravemente
Sangrou dois alfabetos
Russos. Não morreu por pouco.
Faltaram palavras (em português).

Poderia ter sido só isso. Mas o exercício é importante para mim, agora. Senti que precisava seguir. Esse trecho, quase sem alteração, acabou no fim do poema que considero mais bem acabado, publicado acima. Li ainda hoje, de Mario Quintana, que o poeta só pára de trabalhar no poema por acidente de publicação ou morte do autor (ele escreveu melhor do que isso, claro, mas essa é a ideia). Mais tarde, nessa última segunda-feira, antes da aula, no pátio bom de escrever do nosso curso, dei seguimento, ainda no caderno, ainda a lápis:

A casa não era de barro
A frase não era de barro
Eram de cuspe, de engasgo
Sapos, sucos gástricos
De merda, merda
E de pensamentos contrários.
Uma pá grande deu jeito.
Dedo, furo de janela
Dedão, buraco de porta.

O russo do lado de fora
Fuma desconfiado
Espera pela chuva
Pingam letras árabes
Mas a casa agora suporta.

O que foi isso? Pena Solta é como chamo isso. Deixar o pensamento fluir no papel. Tem ritmo, eu acho. Aproveitei várias coisas. Mas quê mais?
Muitos de meus poemas publicados em no site que mantenho www.qualquerquoisa.com.br  nasceram assim, com pouco trabalho posterior à Pena Solta. Mas tem sido diferente com os textos que venho escrevendo depois que começou o curso. Deixo-os decantando no papel. E na cabeça. Trabalho possibilidades, questiono o sentido, com a pergunta mágica: “é isso que eu quero mesmo dizer”?
A resposta foi não. Só a sonoridade não mais me satisfaz. Não só isso. Quero um pouco mais; dentro de minha limitação, hoje, posso um pouco mais do que isso – traduzindo e resumindo o que tenho pensado sobre escrever. Então passei o tempo disponível pela manhã de hoje, terça-feira, avançando um pouco no atraso do ponto no trabalho, depurando o tal do querer-dizer – esse termo está no texto da Ingedore, que ainda não li inteiro, mas vou. Tem outro termo no mesmo parágrafo: “projeto de dizer”. Achei bem legal, combina com a necessidade que sinto em organizar as ideias.
Mais abaixo, há o que posso chamar de penúltimo rabisco do poema, então já escrito no computador. Da primeira versão no papel, a lápis, para essa, o poema mudou bastante. Quis por exemplo imprimir certa métrica  - não estou habituado a essa restrição.  Para seguir trabalhando no texto, imprimi e passei a rabiscar a lápis as correções desejadas. Em alguns trechos, é um rabisco sobre rabisco - e às vezes para manter tudo igual.
Outras mudanças: Alterei a primeira frase solta do poema, depois da primeira estrofe, para algo mais coloquial. Sinto que às vezes uma frase mais próxima de como falamos informalmente, em meio à construção bem diferente da oral (que é o poema), no meio do texto, quebra positivamente o “protocolo” e favorece a sonoridade.

O russo pensou numa casa
De letras russas, estacas
paredes, pilares,
baldes de frases,
tirados de um livro
de ói ou évisqui. 

Ao russo, a letra é de barro.

Mãos de lama, chão,
descalço a ver nuvens.
Não há cimento, vírgula
Palavras de encaixe
Crime e castigo
Firmeza é ilusão.

De barro e papel,
uma casa de estantes
De romances, poesia.
Uma casa de instantes,
Em longas leituras
sem previsão de breve chuva.

O russo sorri sua casa de barro.

Quando viveu em outra mais firme,
era de cuspe, engasgo,
sapos, sucos gástricos
de merda, tinta branca,
galhos e frases
e pensamentos contrários.

Mas aí choveu.

Era de outra língua a água.
A casa do russo caiu.
Feriu-se gravemente.
Sangrou dois alfabetos russos
e não morreu por pouco:
Faltaram palavras (em português).

Mas de barro e de frase, tudo que cai se refaz.


Principalmente, repensei esse fim. Compare a frase que fecha o texto logo acima com as que estão no poema final, postado primeiro. Eu estava perdido com o fim do poema. Queria amarrar a ideia das letras de barro, da casa, com o fato de o barro ser reaproveitável (derretido pela chuva, de volta ao estado original). Mas algo me incomodou nisso. Se palavras são de barro e derretem-se, e frases são refeitas, o escrito e o dito são assim tão voláteis? O barro seco vira caco, não exatamente barro novamente (… )
(…) Sabe o que foram as reticências? Escrevendo sobre o processo, acabei voltando ao texto final e quis deixar isso registrado – ué, é parte do processo! A última frase seguia frouxa. E eu, inconformado. Pois acredito que achei um fim mais apropriado ao que desejava escrever. E ficou mais coerente, para mim, com a ideia inicial, a frase sobre o pensamento de Bakhtin. De resto, empresto de novo algo de Quintana: “E nunca me perguntes o assunto de um poema. Um poema sempre fala de outras coisas”.
Há tantos modos possíveis, não? Esse foi o meu, agora. Com as restrições que minhas escolhas, minha vida, me impõem. Mas que não me impedem de escrever, de algum modo, do modo que posso. O escritor que sou nesse fim de março duvida mais do que escreve, muito mais, que o escritor que eu era no começo de fevereiro. E por duvidar mais, sinto-me mais seguro do que escrevo.

domingo, 18 de março de 2012


Vô Nei
Denise Pellegrini

Meu vô Nei é surfista... Sempre que pode ele vai para a praia. Logo que nasce o Sol, ele pula da cama – e sem despertador. Minha mãe disse que quando a gente fica velho não precisa mais disso: acorda sozinho e sempre no mesmo horário, que nem quando o relógio tocava. Aí ele tira o pijama, coloca uma bermuda e uma camiseta, passa na cozinha pra pegar uma banana e vai ver se tem onda.

É claro que ele sabe olhar a previsão na internet! Já salvou nos “favoritos” os sites que mais acertam as condições do mar, mas acostumou a sair de manhãzinha “só pra conferir”. Vai andando, ouvindo os passarinhos, dando “Bom dia” pra um ou outro que se levantam cedinho como ele. Chega, vai até a beira da água pra molhar os pés, analisa, analisa... e decide se vale a pena andar três quadras com a prancha debaixo do braço. Não é preguiça, não. Ela é mesmo muito pesada pra carregar à toa.

Assim que volta pra casa, começa o ritual: vê se no long não tem trincado, furo, batida. Só aí passa parafina. Enquanto isso, tá todo mundo dormindo. Minha avó também, mas quando ela escuta o mexe-mexe dele se preparando fala lá do quarto: “Não esquece de passar protetor solar!” Aí ele responde: “Já passei!” – o que nem sempre é verdade.

Ele fez 60 anos no dia... não nesse sábado que passou, no outro. Mas nem parece. Não tem cabelo branco. É que, na verdade, não tem cabelo. Quando sobrou só um pouco dos lados ele resolveu passar máquina zero. Enrugado? Que nada. Só tem uns risquinhos perto do olho que a vó chama de pé-de-galinha, mas não tem nada a ver com esse negócio de ficar velho. É porque meu vô Nei está sempre rindo!

Meu vô Nei tem uma moto... Mas ele não é motoqueiro, é motociclista. E, como os entendidos no assunto sabem, isso faz toda a diferença. Ele não passa entre os carros, correndo e buzinando, na hora em que o trânsito está parado e a cabeça dos motoristas fervilhando.

Ele gosta é de pegar a estrada. Diz que é por causa da sensação de liberdade. Fala que adora andar de moto porque nada fica entre ele e a natureza, o vento, as árvores balançando, o Sol – e às vezes a chuva, é verdade. E é por isto mesmo que a vó não vai junto: ela tem pavor desse negócio de não ter nada em volta. Nada pra proteger do calor (“Afinal, já inventaram o ar condicionado!”), da chuva e de uma batida. Se ela briga? Que nada! “Ô, meu amor. Vai lá que eu vou ficar aqui lendo no jardim!”

Mas o vô anda todo equipado. Tem capacete que nem os dos pilotos de corrida. Tem protetor de coluna “pra não ficar entrevado”, como diz a vó. Tem pescoceira pra não ser degolado pelas linhas de pipa. Tem jaqueta com proteção nos cotovelos. Tem calça com proteção no joelho. Tem bota e, claro, capa de chuva. E só com tudo isso é que ele tem a permissão da vó pra viajar.

Todo ano o vô faz um passeio bem comprido. Roda, roda, roda até chegar numa cidade nova. Aí a vó vai voando atrás. Pega o avião e rapidinho encontra com ele. Eles passeiam – a pé e de carro – e quanto acham que já conheceram tudo ela pega outro avião e volta pra casa. Depois de uns dez dias o vô chega, com uma dorzinha nas costas e cheio de histórias pra contar. Ele fala que nessas aventuras economiza um ano de terapia. Acho que é também por causa da moto que o vô tá sempre feliz.
Continua...
 Amor baliza pensamentos

Marina Bueno Cardoso

De onde ela veio, traz referências difusas que não se coadunam com sua visão de mundo. Além de terem uma visão senhores do engenho, e se portarem sempre dando carteiradas, tem muito, muito apego à matéria. Money makes their world go around, e eles levam sempre a melhor. Quem  é para ela chamar de pai faz ouvidos moucos para suas palavras, que para ele são avessas aos seus princípios. Ela escreve e escreve para esse grito surdo que só aqueles que a aceitam sentem a ressonância. Palavras e mais palavras a rodeiam e aquilo que antes escrevia na parede do seu quarto hoje traduz em páginas e páginas digitadas aos borbotões, que  traduzem sua indignação com o mundo que a obrigam a enxergar cenas cruéis. Crianças baleadas nas calçadas são carregadas por mães em desespero, o sangue rola pela sarjeta. Os mandantes dos crimes não são punidos, pois a palavra de ordem é deles e a lei é do mais forte. Ela se indigna, tentam emudecerem-na, internam, dão eletro-choque para ver se calam sua voz. Por algum tempo ficou catatônica, depois, pouco a pouco conseguiu com muito esforço recuperar aquilo que sempre foi, com a retidão de seu caráter e convicção de que todos merecem dignidade, e com o amor na baliza seus pensamentos, sobreviveu. 
Inspirado no filme Borboletas Negras

sexta-feira, 16 de março de 2012

carmen gravou seu nome (duas vezes) na orelha do livro
carmen gravou seu nome numa caligrafia forte e grave
carmen gravou com bolinhas verdes dois poemas
carmen gravou tempos sombrios
carmen gravou a janela verde

margeio as marcas de carmen
carmen

terça-feira, 13 de março de 2012

12.03.2012 no calendário mineiro


Faltam nove meses pra 12.12.12.
13.13.13 vai ter não.
E isso lá é motivo de fim de um mundo?
Esperava mais da Alta Administração.
Sempre esperei, aliás.

E se a esperança n’aqui anda assim,
imagine na d’Outro mundo!
Qual, onde, por quê?
Um dos que quase todo mundo crê
mesmo sem a menor puta pista.

Cá entre nós, não acredito em salvação.
Creio é nos bombeiros!
Nas cinzas da contradição até que pode
sobrar algum dinheiro;
pr'um pão de queijo de depois do fim. 


De um rabisco a outro, vão brotando ideias. Essa nasceu na aula de ontem. Escrevi algo sobre as cucas que caíam da árvore no pátio da faculdade e, ao escrever a data, pensei nesse, das "previsões aztecas" do fim do mundo. Dei uma ajeitada pequena para ficar do jeito que eu (acho) que queria, e publiquei. Nasceu mais pronto do que deveria? O que publiquei antes (Ainda bem), cozinhei por mais tempo, uma semana toda, mexendo nele todo dia, tirando e recolocando trechos, pensando bastante nos porquês de algumas frases. Nesse não. Talvez por ter a intenção de ser mais para o divertido do que de "salvar almas". 
Nesse aí, ajeitei as estrofes, para que ficassem com cinco linhas cada. Também procurei dar mais ênfase ao sotaque regional que imaginei. E também mexi numa coisa ou outra pela sonoridade. Abaixo, o poema do jeito que rabisquei primeiro, na aula:

Faltam nove meses
para 12.12.12.
13.13.13 não haverá.
E isso é motivo de fim de mundo?
Esperava mais desse mundo. 
Sempre esperei, aliás. 

E se a esperança aqui anda assim, 
imagine no outro mundo!
Qual? O que quase todo mundo
crê que exista, sem a
menor puta pista.

Não creio em salvação, mas creio 
nos bombeiros. 
Nas cinzas da contradição, pode
restar um dinheiro
para o pão do fim do mundo. (e rabisquei por cima da frase um 'depois do') 

sábado, 10 de março de 2012

Ainda bem (letra e música para o silêncio)



1.letra
Nos primeiros passos,
pés querem correr.

Não há correntes à vista.

Mas de pé o mundo é maior.
Do alto, o chão mais duro.
E um tombo, dor de fim
De uma inocência.

Do meridiano
do ainda-não-sei
Ao trópico
do ainda-não-posso
Imaginário é só o contrário.

Não há correntes à vista
Nem o que as há de romper
Todo alento é o ainda!


2.música
Ainda passos
Ainda quedas
Ainda choros
Ainda esperas
Que inda
se cante depois
de tudo o que ruiu.

Ainda ando
Mesmo assim
Manco ainda
Andando a vida
Que inda corre
apesar de um ponteiro
que na queda partiu.

sexta-feira, 9 de março de 2012

Para Pedro Pedro Para






















Conversei com uma Pedra.
Como é largamente sabido
pedras são elementos duros.
Duros na queda.
Mas garanto.
Conversei muito com uma pedra.
Pedra rolada.
Conversei com o silêncio da pedra.
Pedra ralada.
Confesso.
Foi uma conversa animada.
Encontrei de saída, dois buracos fundos que me olharam e sorriram.
Fiquei petrificada.
Apresentei-me. 
Bons modos são bem vindos no reino mineral.
Quis sentir o relevo e a textura desse elemento tão parcial.
Passei os dedos sobre.
E descobri
pedra sobre pedra.
Então contei.
Contei da moça tatuada.
Dos cavalos de Lorenzo.
Das coisas que moram dentro das casas.
Do mundo inteiro.
Dos mundos inventados nas ruas.
Contei.
Contar, a pedra não conseguiu.
Mas pasmem, tentou.
E de tanto tentar
conter a vontade de contar
água  do rasgo fundo da face exposta da pedra
começou a brotar.
Eu, água mole.
Ele, pedra dura
caída feito menino do alto da vida curta.
Agora Pedro é espera.
Eu,procura.