segunda-feira, 30 de abril de 2012

Seco e esturricado















Ela era famosa.
Ele também.
Aliás, não se sabe até hoje quem alcançou maior fama, ele ou ela.
Em comum, a mesma morte. De resto, naturezas distintas.
Ela generosa.
Ele mesquinho.
Viviam na mesma terra.
Ele mais para dentro da cerca, passava os dias a triturar, coar, e armazenar sua mesquinhez.
Ela na beira da estrada, meio cá, meio lá, deixava a mostra toda frondosa generosidade.
E por estar assim tão exposta, ela era admirada pelos que passavam pela estradinha de terra. Muitos não resistiam e acabavam se aproximando mais e mais, até conseguir tocá-la. E ela que essencialmente era um ser que alimentava corpo e espírito de toda gente, se entregava.
Por isso ele não se conformava. Era tomado por um sentimento ancestral, a idéia de posse daquilo que na essência é de todos.
Nessa luta muda, os dois se engalfinhavam dia depois de dia.
A cada ataque recebido ela parecia ficar mais forte, e ele, mais cruel.
Foram doze anos assim.
A história ganhou montanhas e vales, voou de boca em boca e a cada vez que era contada, ele era amaldiçoado por sua ira dos infernos.
Ela velha ficou mais sedutora. Ele arqueado e sem viço.
Num dia de janeiro, estação das águas, imerso no seu negro rancor, ele resolveu dar fim ao que considerava ser um martírio.
Pegou um machado e seguiu rumo ao desfecho final.
Com dificuldade agarrou a ferramenta e quando estava pronto para dar o primeiro, do que havia planejado uma série de golpes, foi atingido por um raio.
Caiu sem não antes perceber que ela também fora atingida. O raio rachou ao meio seu poderoso tronco.
Morreram os dois. O homem e a mangueira.
O corpo ficou escorado num galho. Conheceu a morte ao lado daquela que havia tentado matar durante toda vida.
Dele, só restou pó.
Dela, um pedaço de tronco morto que virou banco.
Agora, onde quem outrora pegava manga senta para contar a história de um homem que de tão ruim, tão ruim, morreu seco e esturricado ao lado da mangueira que tanto odiou.

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